quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

QUEM DISSE?

Foto - Helena Almeida
Acendeu nos dedos a ponta do cigarro de palha que tinha sobrado de ontem e tragou forte a capa dos CD’s de Hendrix que moravam em cima da mesa de vidro no bico da sala. Roxo. Estava brincando com cores. Pensamentos não lineares. Ela, sempre, a mulher para quem mais havia escrito textos em toda sua vida. Bourbon e xarope de paz para acompanhar. Quem disse que não podia passar do ponto?

Música da rua, orquestra afinando, celular, bip. Diapasão de lá. Contagem. Desligou a luz e o telefone para se manter isolado dela. Quem disse que não poderia ser livre, e só? Ele e seu teto estavam apenas. Ela era a sua história. Longas noites passeando pela lanterna da lua e olhando reflexos. A cidade de São Paulo à noite tem luzes escondidas. Sozinhos em casa. Quem disse que não podiam passar do ponto? Sempre passavam.

Não se lembrava a última vez que ela esteve tão linda, de lápis preto escrito na pálpebra. Então de novo, não se lembrava mais dela. Reescreveu a história. Só faltava avisá-la que tinha transtornado o final. Agora eles podiam ir para longas noites na capital da Lombardia, na Ponte Velha ou em Jordaam. Não importa se realmente iriam. Queriam descobrir do quão alto poderiam cair.

Tudo errado. Não anotava nem o que escrevia. Perdia na fumaça. Fazia questão de enlouquecer aos poucos. Enlouquecia dela. A pupila branca no canto do céu lembra o brilho da íris quando ela morria prazer com o nome dele língua. Ele transformava pressão em fluído, quando sua boca estava nela. Ela, para explicar, grunhia uma única letra. As conversas do silêncio do toque recriavam o gemido dos dois.

Plantou amnésia dela, mas jamais perdeu a memória deles fazendo amor de chão. Fome e sede do gosto propagado no apoio da língua. Memória do cheiro de um par espalhado na cama de um.

Difícil foi deitar de pele sem ela, o resto do fim da história.