sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

FELIZ MAIS DO MESMO?

A cabeça cambaleava de um lado para outro desenhando o infinito. Mão espalmada acompanhando o desenho do rosto, sentindo na cabeça dos dedos os cabelos da cara. Estava só, então passar as duas mãos na cabeça e no rosto não era sinal de desespero, era autocafuné.

Respirou fundo e abriu os olhos. Balançou o pescoço de um lado para outro quase fazendo as orelhas ouvirem as clavículas gritando estalos.

A música não estava agradando. Procurou alguma coisa mais “swingada”. Era complicado fazer um balanço do último calendário. Surpresas do bem que lhe faziam bem. Amigos de sempre. Faltava um. Faltavam alguns. Faltavam dois grandes.

Havia um par de ombros de olhos que mudavam de cor. Estariam ali até o fim dos tempos e aquilo acalmava seu inspirar a ponto de expirar. Sua cabeça não funcionava direito. Não funcionava como as outras.

As vezes escolhia escrever, criar personagens para contar suas histórias. Nem sempre as histórias eram dele. Sempre e nunca eram. As vezes misturava.

Alardeava preferir ter um dia comum depois de outro dia comum. Natal, ano novo, aniversário, mentia que nenhum calendário lhe trazia diferença.

A cabeça cambaleava de um lado para outro desenhando o infinito. Mão espalmada acompanhando o desenho do rosto sentindo na cabeça dos dedos os cabelos da cara, e sabia sorrindo que sem a renovação do ano novo tudo seria complicação inalterável. Não dava para aceitar um continuar em sequencia. Se não houvesse aniversário do ano. Se não houvesse ano novo.

Se o ano não revirasse não haveriam novas esperanças, não haveriam promessas e anseios. Preocupação permanente, estável, inacabável, inflexível, invariável, infindável, depressão.

Sem o transformar da folhinha tudo permaneceria estático, imutável, enjoativo. Seria enfiar a cara num prato fundo de brigadeiro todos os dias.

As luas não mudariam de fase, a vida seria uma lagoa parada. Os ventos levariam ao mesmo lugar e a esperança de renovação morreria sem doze uvas, três caroços de romã ou uma colher de lentilha.

As listas de promessas seriam uma resma de papel branco, os fumantes permaneceriam fumantes, e os abandonados jazeriam definitivamente sós. A balança não reduziria sua escala, e as velas queimariam sem motivo justificado.

As rosas brancas não iriam ao mar, sete ondas morreriam tristes na praia, o vinho de bolhas quedaria estático nas prateleiras e o horóscopo chinês teria apenas um signo.

Sem o aniversário do ano, não haveria próximo para ser diferente.

4 comentários:

  1. Marcello, parabéns pelo texto!!! Uma palavra para defini-lo: EXCELENTE!!!!

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  2. As datas,os rituais servem para marcar um tempo que jamais deixa de correr e fazer acontecer.
    Mito legal o texto.

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  3. Exato. Perfeito. Sério mesmo. Meus parabéns, texto muito bem construído e palavras "encaixadas" corretamente ;)
    Adorei.
    Sucesso SEMPRE, abração Fiore :D


    Ewerton Lenildo – Academia de Leitura
    papeldeumlivro.blogspot.com
    @Papeldeumlivro

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  4. Ler realmente é uma grande viagem! É transportar nossa mente... Viajar na história. To eu aqui a viajar neste texto maravilhoso e lembrando-me de datas memoráveis que marcaram minha existência e a história da humanidade! Ser humano sem passado sem memória, sem data pra comemorar... Não consigo imaginar!

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